18 dezembro 2009

Discursos Sobre a Cidade - 77


Discursos Sobre a Cidade - 77, originally uploaded by frproart.

“A cidade do silêncio”


Entre as dez e as onze da manhã deste domingo outonal de 18 de Outubro, descíamos a Rua Direita, encostado às casas do lado esquerdo, aonde batia um sol temperador do frescote da sombra que cobria o resto da largura da rua.
Uma rapariga saiu do florista empunhando uma única flor como se transportasse uma vela em procissão.
Não se via mais vivalma, nem se ouvia o menor zumbido.
E o som dos nossos passos ecoava que nos parecia um estrondo. Até parámos para melhor dar conta do eco que um passo, ou dois, em frente, produzia no empedrado.
Somente ao chegarmos à esquina da Ladeira da Brecha é que topámos com duas criaturas, caladas, a subir a rua.
Que estranho este deserto, de pessoas e de barulhos, na nossa cidade!
No Largo do Arrabalde, uma dúzia mal contada de homens com cara de pasmados e olhar ausente. Em frente ao antigo “Silva Mocho” apareceu um polícia que, com cara de estar a acabar a puberdade e com uma curvatura corcunda a comprovar o cansaço do esforço dispendido para chegar da Esquadra até ao Largo, e com uma farda chegada do alfaiate no dia anterior, abriu o «caderno de encargos», afinou uma esferográfica e, com ar ministerial, começou a registar o auto de transgressão. Sim, porque naquele domingo de manhã, o «gajo» que ali deixou o carro não tinha nada que o deixar ali.
Na esquina da antiga “Casa de Saúde do Dr. Alcino”, outro polícia, com altura e elegância da Torre de Menagem, falava “assertivamente” (vai com “”para lembrar que está na moda, e queremos ver os «in» consolados!) com um garimpeiro de bisbilhotices lá do Largo do Arrabalde.
Deitámos mais um olhar de cortesia às memórias romanas, então destinadas ao tratamento da saúde e da beleza; caminhámos pela Ponte, sob a qual se arrasta, com indecente e má figura, um rio que outrora era limpo, cristalino; onde se aprendia a nadar e onde os peixes desfilavam em garbosas paradas ou fazendo acrobáticas gincanas (que nas noites de Verão, às 5ªs Sábados e Domingos de Verbena, ao som da música dos “Pardais”, dos “Canários” ou do “Calypso” nos deliciavam com coloridos “Tattoos”), e se podia passear e namorar nos barquitos do “Redes” e do “Lombudo”.
A fotografar as “Colunas” estavam três raparigas. Eram estudantes de “Turismo e Termalismo”. Ouviram falar das Termas de Chaves e vieram à procura de inspiração e argumentos para um trabalho escolar. Castelo, Caldas e Ponte Romana eram as suas referências. Tinham uma vaga ideia acerca de uns «Fortes». Mas não sabiam se era possível visitá-los, nem onde ficavam. E julgavam que a cidade correspondia ao território da margem direita do rio.
Nunca nos cansamos de olhar a fachada da Igreja da (Freguesia) Madalena! Lá por dentro deve haver grandes mistérios - está sempre fechada! Não tem edital com horário de funcionamento ou de abertura ao público …. nem onde procurar a chave!
Parece que CHAVES tem vergonha de mostrar as intimidades de alguns dos seus monumentos!
Para umas coisas, pudor a mais; para outras, vergonha a menos!
Estava na hora de trincar mais um (ou dois!) “Pastel de Chaves” e subimos “Stº António”. Na “Pedreira do Baptista” já se viram três compadres na conversa, mas o torcer o pescoço para um lado e para outro à procura de qualquer novidade que lhes desse alento para o «dar à lingueta». O “Sport” ganhava um cliente na esplanada, e, à porta de uma padaria, uma padeira, perdão, uma “técnica superior de fornecimento de produtos energéticos e alimentares de panificação”, veio mostrar o seu ar ansioso pela chegada de um só cliente que fosse.
Daí até ao “Jardim do Bacalhau” nem peixe, nem pescador. Apenas uma «pescada» apetitosa se cruzou connosco! Era de «raça Tamegana».
Que sossego o dessa manhã, na Cidade do Silêncio!


Tupamaro

1 comentário:

celestino disse...

Na verdade, já não temos gente. Veja meu caro Tupamaro que os de Lisboa, esses que, dizem, se dedicam à "nobre" arte da política, até já ultrapassaram a fase do despovoamento (hoje, aliás, já nem o D. Sancho, que por aqui andou, nos valerá)e, despudoradamente, só sabem pronunciar o verbo desertificar.
E o problema é que alguns até foram daqui para lá. Esqueceram rapidamente as raizes e, vai daí, mandam-nos às malvas.